O perigo das comparações
- Alice Castro
- 25 de fev. de 2022
- 3 min de leitura
Atualizado: 3 de out. de 2023

Enquanto estivermos vivos, estaremos em uma busca constante pela nossa identidade. Quem somos, qual é o nosso lugar no mundo, qual é o nosso propósito (se é que ele existe)? Buscando respostas para essas questões tão complexas, embarcamos em uma jornada de autoconhecimento que, inevitavelmente, vai passar pelo nosso relacionamento com outras pessoas e com o mundo que nos cerca. Afinal, somos seres sociáveis e não existimos fora de contexto. Por mais que a gente queira procurar soluções apenas no nosso interior, é impossível ignorar o impacto do mundo exterior na construção da nossa personalidade.
Desde bem cedo, somos ensinados a determinar nosso nível de inteligência, popularidade, beleza ou habilidade por meio da comparação, usando outras pessoas como parâmetros. Em casa, nos comparamos aos nossos pais e irmãos. Você é o filho mais distraído, o mais falante ou o mais reservado que prefere ler livros? Puxou ao pai, à mãe ou não poderia ser mais diferente dos dois? Na escola e faculdade, tentamos encontrar nossos grupos analisando os colegas e copiando o comportamento daqueles com quem nos identificamos mais. Você prefere ser como o fulano, o garoto mais descolado que senta no fundão, ou inteligente como a ciclana, que senta na frente e tira as melhores notas?
Por meio de comparações com os outros, aos poucos descobrimos o que queremos, quais são as nossas prioridades, gostos e desgostos. Isso é totalmente natural e inevitável, principalmente quando somos mais jovens, influenciáveis e ainda estamos explorando várias rotas para encontrar um caminho que nos agrade. Até aí tudo bem.
O problema é que no mundo capitalista em que vivemos, as vagas das melhores universidades são limitadas, os cargos de liderança nas empresas são poucos e, conforme crescemos e amadurecemos, começamos a perceber que não é todo mundo que vai conseguir um lugar ao sol. Acabamos nos curvando a essa realidade e desenvolvemos um pensamento perigoso de “você ou eu”, porque não há espaço para todos no barco. Sabemos que quem não se destacar vai ficar para trás. E ninguém quer ficar para trás.
Nesse momento, paramos de encarar as pessoas como pontos de referência e passamos a percebê-las como competição. Deixamos de simplesmente categorizar os indivíduos em grupos diferentes e passamos a hierarquizá-los em níveis, do melhor ao pior, tentando descobrir em que posição estamos dessa lista, se isso vai ser o suficiente para fazer com que sejamos notados em meio à multidão. Essa preocupação só piora quando consideramos a evolução da internet. Antes, só conseguíamos nos comparar com as pessoas próximas e conhecidas. Agora, podemos fazer isso com qualquer pessoa do mundo por meio de uma tela. Se encaramos todos como competidores nesse novo cenário, a conclusão óbvia é que sairemos perdendo.
A partir desse momento, a comparação se torna limitante. Ela pode te impedir de se enxergar com clareza, fazer com que você sinta medo ou vergonha de tentar alguma coisa nova ou de expressar uma opinião diferente daquela do seu grupo, derrubar a sua autoestima e te deprimir com uma sensação angustiante de que você nunca vai ser tão bonito, feliz, talentoso ou bem sucedido quanto o outro. Essas inseguranças vão corroendo a nossa confiança lentamente, expondo o nosso lado invejoso e enferrujado, devorando a nossa empatia e nos transformando em criaturas mesquinhas e egocêntricas. A comparação vira competição. Quando isso acontece, todos nós perdemos.
Eu adoraria dizer que tenho uma solução para esse problema, mas seria muito prepotente da minha parte acreditar que eu posso tirar essa pedra do meio do caminho. Tudo o que eu tenho é uma sugestão, algo que aprendi depois de cometer muitos erros e de ficar cansada de me autossabotar: não caia na armadilha de tentar competir com as outras pessoas, ou categorizá-las como melhores ou piores do que você. Precisamos fazer um esforço para abandonar esse ciclo vicioso e colocar na nossa cabeça que somos apenas diferentes. Não temos que ser melhores do que ninguém, deveríamos lutar juntos contra o sistema. Se não cabem todos no barco, precisamos de barcos maiores, não de pessoas dispostas a atirar os outros no mar.
Vamos voltar para o princípio, quando ainda éramos capazes de usar a comparação para encontrar bons pontos de referência que nos ajudavam a descobrir nosso próprio caminho. Não vamos nos rebaixar a ponto de tentar sabotar a trilha alheia, ou perder o rumo porque passamos tempo demais olhando para os lados. A nossa maior preocupação não deve ser estar à frente ou atrás dos outros, apenas continuar andando. Isso já é difícil o bastante.
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