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O encantador Ripley

  • Foto do escritor: Alice Castro
    Alice Castro
  • 6 de abr. de 2022
  • 4 min de leitura

Atualizado: 20 de out. de 2023


Photo by Ahmed Zayan on Unsplash

Apresentado aos leitores no livro O Talentoso Ripley, Thomas Ripley é o protagonista intrigante da série de cinco thrillers psicológicos escritos por Patricia Highsmith. A autora norte-americana é reconhecida pelos dilemas morais e éticos aos quais submete seus personagens para revelar lados surpreendentes de suas personalidades, e Tom Ripley não é uma exceção à regra.

Nos primeiros capítulos, Tom pode passar a impressão de ser apenas um jovem desempregado que mora de favor no apartamento sujo e precário de um amigo em Nova Iorque, mas não demoramos a descobrir que existe muito mais além das aparências. Tom não tem dinheiro ou um sobrenome que abra portas para ele, mas consegue compensar isso com uma inteligência e carisma acima da média, qualidades que rapidamente fazem com que as outras pessoas simpatizem com o rapaz e queiram ajudá-lo. Até mesmo quem está lendo e sabe que Tom está longe de ser completamente honesto e inocente passa a relativizar as falhas do personagem, torcendo para que ele consiga o que quer.

Arrumamos desculpas que justifiquem seus comportamentos duvidosos. Sim, ele rouba um dinheiro aqui e ali de vez em quando, mas ele é um órfão que foi criado por uma tia cruel e vive sozinho em uma cidade grande. Não podemos julgá-lo, veja como sua vida foi difícil. Além disso, ele é muito educado, um bom rapaz que pode até cometer alguns erros quando pressionado, mas depois se arrepende deles. Ele merece uma segunda chance.

Por isso ficamos tão empolgados quando o senhor Herbert Greenleaf, um ricaço dono de uma empresa que projeta e constrói barcos, oferece a Tom uma oportunidade irrecusável: viajar até a Itália com todas as despesas pagas para trazer de volta para os Estados Unidos seu filho único, Richard Greenleaf, que está ignorando os apelos dos pais para retornar para casa há anos. Herbert está disposto a pagar uma quantia alta pelo serviço porque acredita que Tom e Richard são grandes amigos e que, talvez, Ripley tenha alguma influência sobre o seu herdeiro. O que o senhor Greenleaf não sabe é que os dois jovens não passam de meros conhecidos que se encontraram poucas vezes em festas de amigos em comum. Mas é claro que Tom acha melhor não mencionar esse fato e aceita o convite de Herbert Greenleaf para jantar em sua residência e conversar melhor sobre a proposta. Afinal, que mal poderia haver nisso?

Poucos dias depois, Tom visita a mansão dos Greenleaf, como combinado. Herbert apresenta o rapaz à sua esposa, Emily, e Tom consegue conquistá-la rapidamente, se adaptando como um camaleão ao ambiente requintado. Após o jantar, Emily se retira e Herbert tem uma conversa particular com Tom, explicando que sua esposa está gravemente doente e que esse é o principal motivo para o casal estar com tanta pressa para trazer Richard de volta para os Estados Unidos. A situação fica um pouco mais complicada moralmente para Tom agora. Enganar um senhor rico para ganhar algum dinheiro não parecia algo tão ruim, mas mentir para uma mulher em estado fragilizado de saúde e falhar na tarefa, fazendo com que ela passasse seus últimos meses longe do filho, seria cruel.

Tom enfrenta esse dilema por alguns dias, mas sua situação financeira está apertada e ele acaba aceitando a oferta de toda forma, na esperança de conseguir usar seu carisma para de fato convencer Richard a voltar para sua mãe. E nós, nos bastidores, ignoramos suas mentiras e continuamos torcendo para que ele tenha sucesso na sua missão. Queremos acreditar que os fins justificarão os meios e que o protagonista está tentando fazer uma boa ação, esforçando-se para trazer o filho pródigo até os braços da mãe doente.

Determinado, Tom embarca para o vilarejo de Mongibello, na Itália, onde Richard Greenleaf vive. Ele não demora a descobrir a localização da casa do herdeiro e consegue entrar em contato com o colega, mas Richard nem mesmo se lembra direito dele. Tom é mal recebido e o clima entre os dois só piora quando ele tenta explicar a Dickie (apelido de Richard) o motivo da visita. O herdeiro dos Greenleaf está determinado a permanecer na Itália e as primeiras tentativas de Tom de convencê-lo a visitar os pais são frustradas.

Não demoramos a sentir antipatia por Dickie Greenleaf. Além de dificultar os planos de Tom, o rapaz não passa de um jovem bonito que claramente nunca precisou lutar por nada na sua vida recheada de privilégios. Dickie não trabalha, passa o seu tempo pintando quadros, apesar de não ter talento algum para a arte, está envolvido em um relacionamento, mas não se importa verdadeiramente com sua parceira, se é que podemos chamá-la assim, e vive de uma pensão enviada pelo pai rico, mesmo que não queira ter mais contato com sua família. Sua resistência faz com que o nosso protagonista tenha que mudar de estratégia para convencê-lo.

Tom começa então a se tornar amigo do irritante Dickie Greenleaf, acompanhando-o em festas e passeios pela Itália e tentando afastá-lo da namorada, que Tom acredita ser uma das razões que ainda estão ancorando Dickie a Mongibello. O humor de Dickie sofre variações bruscas e em alguns momentos ele trata Tom como se fossem melhores amigos, em outros tem surtos de raiva e quer que ele vá embora e o deixe em paz. Richard gasta dinheiro como se não fosse nada, não se importa com ninguém e não tem preocupação nenhuma na vida, o que começa a fazer Tom sentir certa inveja e raiva do garoto mimado e aumenta ainda mais a simpatia que sentimos por Tom.

Pensamos que, se ele tivesse a vida de Dickie e as oportunidades do rapaz, faria coisas muito mais interessantes com o dinheiro. Enquanto isso, Herbert Greenleaf está mandando cartas, pressionando Tom a lhe dar uma resposta sobre a decisão do filho. Tom não quer admitir que fracassou e decepcionar a família, mas também não pode viver às custas do senhor Greenleaf para sempre. Ele precisa agir logo.

Como essa é uma resenha sem spoilers, eu vou parar de escrever por aqui e te deixar com a pulga atrás da orelha. Fica a seu critério decidir se achou a história interessante e ficou com vontade de ler o livro para descobrir o que Tom decidiu fazer, se foi bem sucedido em sua missão ou se falhou e desapontou os Greenleaf. Tudo o que eu posso dizer por enquanto é que eu gostei bastante do rumo que a autora decidiu dar à história e recomendo a leitura do livro. Patricia Highsmith sabe muito bem como criar personagens fascinantes e dificilmente vai te decepcionar.


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